terça-feira, 25 de novembro de 2008

Petróleo

Qual é o verdadeiro preço do petróleo? Afinal de contas, a alta acelerada desses últimos anos, seguida pela queda absurda dos últimos meses deve dar uma média ainda acima da média histórica. Claro que tem de entrar nessa conta o deflacionamento do produto e o volume consumido. Isso sem contar o famoso preço futuro, aquele extra cobrado para que os detentores das reservas consigam sobreviver depois que elas acabarem.

Mas a questão que me vem em mente é que, conforme o petróleo chega ao fim, ele encarece, e conforme encarece não apenas coloca dinheiro nas burras dos membros da Opep, mas também estimula a pesquisa de energias alternativas. Isso, por sua vez, não colocaria de volta um freio na aceleração do preço?

Lógico que a queda no preço também vai estimular o consumo, e por sua vez, a redução das pesquisas alternativas. Mas muitos países já estão vendo beneficios além dos econômicos (os ambientais passaram a ser valorizados).

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Coisas perturbadoras

Apostou em John Nash e na teoria da colaboração competitiva. Emprestou o bem que mais lhe definia como alfaiate, a máquina de costura, a um bordador talentoso porém desprovido do equipamento. Não que o bordador fosse despossuído de tudo. Na verdade estava em situação bem melhor que a dele, ocorre que era especialista em bordados e não foi previdente o suficiente para comprar o arsenal de costura.

Isso não impediu o competente bordador de aceitar uma bela encomenda, dada como um presente por seus esforçados préstimos com os fios de costura. Ele engoliu a alegria, porém, ao pedir o equipamento emprestado ao concorrente. O alfaiate havia chegado há pouco na praça e confiava no equipamento que tinha como uma forma de levar vantagem na competição costureira. O bordador o conhecia de outros cortes no tempo.

-- Você vai usar a sua máquina? Preciso dela ou não terei como atender ao pedido de um terno italiano caríssimo. -- indagou o bordador.

Um dilema rápido contaminou as idéias do alfaiate. Não emprestar e contar com o mal humor do talentoso bordador, ou afiançar o empreendimendo do concorrente, e correr o risco de perder a máquina e a possível clientela?

-- Tu... tudo bem. -- disse, por fim, o alfaiate, e a dor de uma úlcera se manifestou em seu estômago.

Apostou na competição colaborativa. Concedeu a máquina, comprada com árdua economia.

O bordador recebeu elogios quando o terno italiano ficou pronto, magnífico. Ninguém imaginava que teria talento também com as máquinas. Logo lhe deram crédito para que comprasse a sua própria e pudesse aceitar mais encomendas. Enriqueceu graças ao sucesso e ao talento, e àquela mãozinha que o primeiro alfaiate nunca esqueceu.

Quanto a este, continuou por algum tempo penando, à procura de clientes. O sucesso repentino do concorrente, alavancado por seu empréstimo, ofuscou um pouco seu talento próprio. Sim, ele também tinha talento, embora o bordador nunca tivesse admitido isso, razão pela qual o agradeceu, repassou algumas rebarbas de trabalho que lhe sobravam, tamanho o sucesso que tinha.

Mistérios de Bar

Um babaca encosta o carro no meio da rua, num aprazível domingo à tarde.  A rua é tranquila, tem um boteco na esquina e pessoas despreocupadas. Mas a cena muda quando o cara desce em nossa direção, bêbado.

Burburinhos percorrem o bar, enquanto olhares tensos observam o bêbado beliscar e incomodar todos os comensais de uma mesa próxima. Ao lado, um senhor de barbas e cabelos brancos, bermuda e chinelos (um Papai Noel tropical) acompanha tudo com uma revolta especial. "Por isso eu votei na Marta, esse viado aí só pode ter votado no Kassab", diz, como ventríloquo, mordendo os dentes de raiva.

O babaca continua, mais bêbado que nunca. Lança olhares desafiadores, e caminha para o nosso lado ajeitando as calças, como quem se prepara para uma briga. Dá meia volta e deixa todos irritados. Há uma movimentação diferente, a cerveja esquenta nos copos junto com os temperamentos das pessoas.

De repente uma notícia entre suspiros. "Chamaram a polícia", a tensão dá lugar a sorrisos. A expectativa agora é que o cara não vá, mas que fique o tempo suficiente para ser preso, ou no mínimo levar uma multa. O careca, dono do bar, que estava bebendo com o Papai Noel já enxugou três vezes o suor da testa, enquanto tenta convencer o sujeito a tirar o carro do meio da rua. A essa altura uns dois ou três acidentes já se prenunciavam, a cada carro que entrava mais rápido, ou pedestre que passava desavisado.

Por fim o sujeito vai, incólume. O Papai Noel esmurra a mesa, e retoma a cerveja. Descubro em seguida que ele está tão bêbado quanto o sujeito do carro. Fala sobre as eleições, despeja mais e mais frases homofóbicas e por fim me conta a sua história. Tratava-se simplesmente disso, um bêbado com história.

Deleita-se ao saber que só tem jornalistas na mesa ao lado.

-- Vocês são jornalistas, então devem saber disso. Eu trabalhei num programa nuclear da marinha, ali na Dr. Arnaldo, que aquele viado do Collor encerrou, por causa dos americanos. É verdade, não é verdade? -- E olha para o mais velho, o sujeito que tinha chamado a polícia, que assente.

-- Viu como eu não estou mentindo? Eu cumprimentei o Sarney quando eles inauguraram o programa, em 1986. Me aposentei em 1996, a gente se aposenta rápido por causa da insalubridade.

As respostas eram ora pequenos assentimentos com a cabeça, ora monossílabos irritados, semancóis.

-- Vocês pesquisem por que eles acabaram com o programa. Foi por causa dos americanos! Olha o Brasil não deve nada para ninguém em tecnologia nuclerar. Eles acabaram com o laboratório ali na Dr. Arnaldo porque está há 200 milhas da costa, e os submarinos americanos poderiam detectar. Podem pesquisar e vão ver que não estou mentindo. Não é verdade -- e dava aquela olhada para o mais experiente, que a esta altura olhava o horizonte, o local vazio do carro, que seria palco da grande apreensão.

-- O meu nome? Sherlock, só te digo isso. Não posso dizer mais nada porque tenho um contrato para toda a vida! E riu.

Fomos embora, deixando o Papai Noel Sherlock com sua embriaguez atômica.