sábado, 15 de dezembro de 2007

Do ônibus até a casa

Desço do ônibus antes do tempo. Uma mocinha de rosto fino e boca constantemente aberta pediu para o motorista abrir a porta antes do ponto. O buzinaço dos carros e o engarrafamento natural da Av. Paulista não deixam contra-argumentos ao condutor. Saímos, mais da metade dos passageiros do ônibus. À minha frente uma mulher com terno marrom e tenis laranja, sem meia. Só percebi a sua idade quando mostrou a canela enrugada e cheia de pintas, ao cruzar as pernas.

Aquele movimento incessante na calçada. Sinal de pedestres vermelho. Uma mulher com um rosto bonito e pele feia olha para trás. Tem uma bunda magnífica. Uma chinesa alta e magra ao meu lado parece que nota meu olhar indiscreto e lança-se para frente, como que para barrar minha visão. Cruzo a paulista, seguindo sempre a bunda. Reparo um celular saltando pelo bolso daquela calça social preta apertada. Meus olhos abandonam o objetivo rebolante em frente a uma esfiharia. Um cheiro gorduroso e azedo, que tiram o apetite de qualquer um. Mais um cruzamento.

No outro lado da rua um homem limpa relógios falsificados com um espanador, como que para dar mais valor à mercadoria. Um japonês meio gordo vem em minha direção. Um bujãozinho. Continuo até a esquina. Duas empregadas domésticas me olham. Havaianas engorduradas. Um casalzinho jovem, branco e burguês para do meu lado. A sandália da loirinha riquinha se contrasta com a das domésticas. Atravesso a rua. Passo pela igreja, um menino gordo vem me pedir esmola. Não, está bem vestido. Só repara no cachorro de um senhor que está atrás de mim. Um cachorro peludo e preto, uma espécie de maltês negro e grande. Em frente à igreja uma senhora de olhar triste vende flores. Mais adiante, quase chegando no Extra um senhor, sempre o mesmo, continua reformando cadeiras. Ele martela a fita de plástico cruzada, que trançado faz o assento, imitando aqueles trançados de palha ou vime.

Cruzo o estacionamento do Extra. desço pelo lado, para pegar calçadas com menos movimento. A rua é pequena. Atravesso pelo meio dos carros parados. Na frente do edifício Cidade Vecchia, portões grossos e um lindo jardim, uma ratazana cruza a calçada na minha frente. Entra pela fresta de um desses tampões de concreto que compõe as calçadas de São Paulo. Estou mais próximo de casa. No fim da pequena rua congestionada viro à esquerda. Uma japonesa sorridente passa por mim. Subo até a Treze de Maio. Um menino em seus 16 anos, cabelo raspado, óculos e mochila nas costas espera. Olha para o trânsito como se estivesse esperando alguém.

Rua Papa Pio XI vazia. O mendigo que habita a entrada do consultório odontológico da esquina não está ali. Tem a cara do Seu Jorge. Desço até o apartamento. Aqui é o Chico do 102. O porteiro, com seu sotaque nordestino atende e abre o portãozinho. São 18h26 e as luzezinhas de natal, que enfeitam o teto da passagem na porta do edifício já estão acesas.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Prof Aziz

Aziz Ab'Sáber é um geógrafo. É o homem que melhor dividiu o Brasil em regiões. Ele está presente nos principais livros didáticos.
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segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Um depoimento compulsório

Risadas. Acho que só ouvi risadas sinceras depois da terceira semana. No começo eram respeitosas, estudadas. Perto do fim, a exatos três dias, penso que elas nos definem.

A minha primeira, lembro bem, foi para me apresentar. Veio acompanhada de um sorriso-cumprimento, enquanto me sentava para a entrevista inicial do Curso de Jornalismo. Saiu grave e desajeitada. A última foi ainda ontem, antes de sair da sala. Uma piadinha batida sobre o tema de nosso caderno: o aquecimento global.

As risadas têm lugar e hora para sair. Truncam o diálogo quando se adiantam. Os primeiros risos provocados pelo coordenador do curso, Chico Ornellas, não foram unânimes. Eram comuns períodos de silêncio depois de uma frase do Chico que ninguém entendia. Uma frase que hoje viria acompanhada de uma gargalhada geral.

Aos poucos nos afinamos. Os sorrisos medrosos das primeiras aulas de redação passaram a ganhar movimentos, dinâmica e harmonia. Tornaram-se uníssonos. Em algumas discussões filosóficas chegaram a gargalhadas reprovadoras. Nada que ultrapassasse a barreira do bom senso (tivemos uma palestra dedicada ao assunto).

Choros foram poucos. Nas aulas de Paco Sanchez, quando um perfil mais emotivo era lido. Foram choros honestos, repentinos e sorridentes. Ainda serão mais vezes, espero.

Nas viagens éramos sorrisos. Bocas abertas para retribuir os bons tratos e, claro, comer.

Não deixa de ser engraçado notar como as risadas, que no começo poderiam ser consideradas irônicas, se tornaram amigas. Na primeira semana nos demos rótulos. Um exercício de análise para mostrar a primeira impressão que deixávamos uns nos outros. Algo muito importante, segundo consta. Coube-me a alcunha de limitado, inseguro e inseguro. Nada melhor do que 31 rótulos para cada um dos notáveis egos de nossa turma.

É bom ver o extrato proveitoso disso tudo. Encarar o que ficou de bom, o que realmente importou nos três meses de trajetória. Principalmente da parte séria, que praticamente não aparece nesse texto, mas que contempla valores e conceitos fundamentais ao jornalista. Não houve um dia sequer em que não ri nesse curso. Não porque não levasse a sério, nem deixasse de temer o espectro do ranking que nos rondou durante meses. Mas sim porque fiz parte desse grupo de jovens jornalistas que superou alguns obstáculos juntos. Conseguimos, samba-enredo após samba-enredo (foram quatro de autoria de nosso trio de compositores, mais um axé) marcar com qualidade e descontração essa 18ª turma.